27.1.08

Elas assim sem vocês

"Sempre desconfiei das que cantam com olhos fechados e mãos para cima os versos katmandúnicos de sol, de sal, de mar – “movimentos circulares, zona sul de bar em bar, são bocas em todo lugar”. Ou ela acabou de terminar um namoro ou mente – não faz sentido que moças bem-resolvidas bradem frases como essas em locais públicos".
Contra a Juventude e a favor das fases que passam - leia Tribuneiros.

16.1.08

Hoje eu vou tomar um porre

Pra quem brindou em um café de Paris querendo um pouquinho estar aqui (não queira!).
Pra quem saiu de Angra correndo e manteve os batimentos cardíacos controlados a noite toda apesar de tanto.
Pra quem dividiu comigo o copo de whisky pensando que são determinadas coisas que a gente nunca esquece.
Pra quem não teria mais o que me dar de presente e pra quem me esperaria para comer sorvete de sobremesa depois do lançamento.
Pra quem depois de tudo arrumado dizia “acho que não quero mais brincar” (e até hoje brinca), e pra quem a faz tão feliz.
Pra quem fica ótima de dourado antes mesmo que nós outros saibamos que podemos usar dourado.
Pra quem, uhn, acho que engordou.
Pra quem é praticamente uma estopa.
Pra quem ainda cria três filhos bebezinhos e, como se não bastasse, sobrinhos e netos bebezinhos.
Pra quem me deu Ana Maria Machado, Lygia Fagundes Telles, Ziraldo, papel e lápis.
Pra quem, do alto de seus 95 anos e um divórcio, me aconselhou a não casar com homens bonitos porque eles dão muito trabalho.
Pro rei do karaokê do Japão e organizador fundamental da torcida Raça-Brasil 2014.
Pra quem soube reencontrar sua gargalhada irresistível, pra quem escreve e me conta e pra quem jura ter até hoje os registros do início dessa brincadeira literária.
Para la verdadera artista de la familia y su candango porteño..
Pra quem procura no globo os países onde serão suas histórias, pra quem é irresistivelmente abusada, pra minha assessora e pros que cometeram essas loucuras.
Pros que provaram que se uma coisa está ruim não necessariamente vai piorar, podemos dar a volta por cima.
Pra quem fica desesperada quando eu acordo antes da chegada do pão.
Pra quem reuniu a família e torceu tanto por ontem.
Para quem me levou pra zoar puta em Copacabana e pra espoleta do revolver dele.
Pra quem é meu 911 e o diabinho do desenho animado.
Pra quem, em algum lugar do velho continente, é peça chave na minha vida.
Pra quem é my person e pra essa mala que ela jurou que tinha um humor como o meu (eu sou muito melhor).
Pra quem will always have Paris (até porque lá tem Louis Vuitton!).
Pra quem apareceu de surpresa e me deixou sem palavras.
Pra quem daqui a pouco vai sumir porque está namorando.
Pras que me receberam de braços abertos e bloco na rua.
Pra cúmplice do politicamente incorreto.
Pras pragas, mineiros bígamos, intelectuais rock’n’roll, palhaços, shamus e as tampinhas de cachaça que me divertem tanto.
Pra quem enfrentou comigo la pluie sem ter como voltar para a Rue de la Huchette.
Pra quem mostrou que existe ser chefe e mãe, pro adolescente que tem um amor platônico mesmo sem saber o que é isso, e pra quem ontem era menor do que uma ervilha e hoje canta Cai, cai balão.
Pra quem colocou aquele banquinho na parede que me proporcionou tantas conversas produtivas.
Pra quem teve paciência e carinho de enfrentar a fila e se apresentar.
Pra quem toda semana me mostra que gente é gente, e ainda não inventaram coisa melhor.

Pra quem enlouqueceu em Geribá e me convidou para escrever um texto e pra quem foi sóbrio para Salvador e assim me levou ao site pela primeira vez. Ainda bem que vocês são loucos!

Muito obrigada.

13.1.08

Na primeira vez a gente sempre esquece

Ele não vai ser sempre perfeito daquele jeito, nem vai te achar tão encantadora. Não vai para sempre perguntar por que diabos você não está casada e eternamente comprometida, nem você vai pensar se é mesmo possível tudo aquilo estar disponível nos dias de hoje. Que precisa acordar cedo no dia seguinte e já deveria estar em casa há horas.

Esquece de filtrar todo aquele charme e racionalizar se existe algum futuro. Nem por um segundo você cogita a possibilidade de por trás de tanto empenho existir um psicopata dependente e ciumento. Que ele pode ser um grande mentiroso e destruir seu coração em poucos dias, que da última vez jurou nunca mais ser boba assim, que há pouco tempo estava acabando com o estoque de lenços da casa secando o vale de lágrimas derramado por quem começou do mesmo jeito. Esquece que ele vai te roubar o prazer da solidão, que vai passar essa vontade ingênua de ficar e não pensar em nada.

Esquece que precisa disfarçar a taquicardia, falar menos e parar de esbarrar nele. Nem nota que milhares de vezes ele vai pensar em te beijar e desistir com medo de ser precipitado, que existem pessoas ao redor reparando no seu sorriso bobo e que você não pára de mexer no cabelo. Esquece que os olhos dele nem sempre vão estar te seguindo, que a música está alta mas ninguém ao redor está falando tão perto do ouvido alheio, que nem sempre ele vai pagar mais uma bebida torcendo para aquilo dar um porre de coragem.

Esquece de guardar um pouco da sua versão adorável para depois, esquece que ele não vai falar de você pros amigos com reticências e uma gargalhada sem graça todas as vezes, não vai se culpar por ter perdido tanto tempo com as outras tendo você tão perto. Que a aranha da parede vai considerar usá-los como suporte para a teia se não saírem dali. Que as suas amigas estão dormindo no carro esperando você chegar flutuando, que se você ficar mais feliz vai começar a pular e isso vai ser estranho.
Esquece que isso não acontece todo dia, nem por toda a vida.

Na próxima vez tenta lembrar. E não esquece de guardar para sempre.

Publicado em Seu Martin 1, 10/5/06

11.1.08

Adrenalina

Soltaram fogos na rua e me dei conta de que 2008 só começou há onze dias. Nesse pouco tempo soube que vou lançar um livro e por isso apareci no jornal, aprendi a fazer cobertura de um evento ao vivo e com isso conheci várias pessoas que teoricamente eu já conhecia, participei de um tiroteio, me apaixonei pelas botas da nova coleção da Juliana Jabour, entendi que no inverno vou usar meia-calça colorida, que o plural correto é meias-calças, li um livro sobre a livraria Shakespeare and Company e quis voltar a Paris. Enquanto isso mal consegui acompanhar que mexeram nos meus impostos, soltaram as reféns, Sarkozy saracoteia por aí com Carla Bruni, Madeleine não apareceu, Obama disputa voto a voto com Hillary e me parece que todos deram para chorar em público nos Estados Unidos.
Eu chorei baldes em público depois de sair correndo para fugir do tiroteio. Comemorei cada transmissão ao vivo bem-feita vibrando como vou fazer a cada livro vendido e a cada novo leitor no site e no blog.
Depois que a guerra civil acalmou naquele dia, o segurança falou para mim:
- Entendo que você fique nervosa, é porque não está acostumada.
Com algumas coisas nunca devemos nos acostumar, seja para não perder a euforia da novidade nem o senso crítico sobre o absurdo.

5.1.08

O Rio de Janeiro, fevereiro e março

Baixo Gávea, entro na vaga e vem o flanelinha:
- Posso dar uma olhadinha, madame?
- Claro, são quinze reais.
- Tô fazendo preço especial, linda. Aqui é cinco.
- Para olhar o meu carro são quinze. Esse mês tem IPVA e acabei de fazer a revisão, ele está tinindo. Se quiser pode terceirizar e recolher o dinheiro com cada um que passar e olhar. Já calcula no seu preço o IOF.

Horas depois eu volto e o flanelinha está jantando na varanda do Guimas com o salário do dia.
- Aí, princesa, toma teus quinze. O carro tava na passagem e nego teve que olhar direto, faturei bem!

Tem otário para pagar por tudo nessa vida.

Coluna do Ancelmo Gois:
Motorista de um Volvo blindado vê o ladrão armado bater no vidro e dizer que vai explodi-lo. Pelo auto-falante, responde:
- Zero dois, o senhor é um fanfarrão! Você é que vai se explodir.
E arranca.

Fecharam a praia do Leblon. Imprópria. 1,4 mil coliformes fecais por 100 mililitros a mais do que o normal.
Para garantir o verão, dona Vanda, da barraca onde trabalha Reginaldo, montou várias piscininhas Tone na ciclovia, bem ali onde daqui a pouco começam a passar os blocos do Carnaval.

Enquanto isso, em uma livraria a algumas quadras da praia poluída de Manoel Carlos, os Tribuneiros preparam seu lançamento.