27.5.08

A Hard Day's Night

Um ser abalado por achar que não vai conseguir fazer nada. Cansada de construir um sentido para o mundo em que vive, saber de si e dos outros, queria tirar férias de mim e por um tempo ser resultado de uma idéia pré-existente. Poderia ter nascido uma caneta, que nasceu para ser caneta e apenas é. Essência definida.
Trocaria a liberdade de mudar minha vida pela certeza imutável do que já vivi. Mas nem é certeza, muda sempre o ponto de vista. Aumenta a exaustão. E se eu falhar na minha essência, se minha existência for estragada pelas minhas trapalhadas e incompetência? Fui condenada à liberdade mas não me lembro de ter assinado esse acordo, não aceitei as regras. Quem não consegue comprar uma roupa vai falhar no projeto fundamental. E eu não decidi ainda qual é o meu projeto fundamental, já devo estar atrasada no cronograma, não aprovei orçamento nem selecionei equipe, não fiz o treinamento, eu vou falhar.
Então sou responsável pelo mundo que projetei. Pelo mundo todo eu levo a glória ou a culpa sozinha? Por que eu acho que vai ser culpa e não glória? Angústia previsível com tanta responsabilidade existencialista sobre as minhas costas. Eu quero o universo do sonho, isso é liberdade. Poder realizar qualquer coisa instantaneamente e não ter pessoas cutucando para avisar que não é bem assim, que são escolhas parciais e não livres, opções limitadas. Não é verdade que nada fora de mim define meu futuro. Os outros atrapalham, criam conflitos com projetos sobrepostos. Eles não serão punidos, obrigados a participar do meu plano? Inferno os outros. Coloca no acordo outra forma para que eu me veja que não seja através dos olhos deles. Ou me dê outros que me ajudem.
E se eu nem sempre tiver consciência da conseqüência dos meus atos? Quero férias de conseqüências, pausa na consciência. Alguém podia se responsabilizar pelas minhas decisões enquanto eu descanso um pouco. Posso ao menos voltar atrás? Undo? Desmake. Não estou fugindo da minha auto-determinação, mas quero conversar sobre o meu destino, preciso saber se dá para contar com ele. Nunca li o último capítulo do livro antes de chegar lá, nunca baixei episódios de Lost que não tenham sido exibidos, posso pelo menos saber se na minha história eu vou dar certo no final?
Eu, que por vontade própria ajo e afeto o mundo todo, peço licença. Preciso confessar que talvez não seja capaz. Nem sempre é justo o que o mundo faz comigo, ele podia me dar o caminho mais fácil. Eu aprenderia, juro que aprenderia. Me ouve, Sartre! É importante sim o que o mundo está fazendo comigo! Não sei o que eu vou fazer com o que o mundo está fazendo de mim! Eu aceito o acordo, com uma condição: de vez em quando, posso chorar?

Há dois anos existencialmente em Seu Martin 1.

16.5.08

A pessoa é para o que nasce

Eu estou muito preocupada com a Mulher Melancia.
Nosso primeiro contato visual foi no Casseta e Planeta. Um deles imitava o João Gilberto e uma garota que se esfregava na cadeira a imitava. Achei engraçada a caricatura, qualquer médico classificaria aquela anatomia de anomalia e a dança mais parecia interpretação de uma atriz pornô descontrolada. De repente descobri que a cena não era uma paródia! Aquela era a célebre em carne, algum osso e carinha de quem tá gostando demais.
Hoje leio que Andressa (ela tem nome) quer fazer lipoaspiração. A ex-créu começou um tratamento que diminui 3 centímetros dos seus 119 por sessão. Pelas minhas contas, dentro de um mês ela vai desaparecer! Não digo minguar até a morte, mas se parar de esfregar a super-bunda nas... cadeiras... vai sobrar o quê? Andressa não pode virar mais uma ex-gostosona porque alguém tem que desempenhar essa função. Tal qual o futebol, o Playstation, a cerveja gelada e os camaradas, os homens precisam das Mulheres Melancia, portanto cabe às Mulheres Banana convencê-la a continuar bunduda.
A Mulher Banana*, se tivesse um quadril de 120cm, correria três horas por dia numa esteira. Ela morre de vergonha ao ver a mãe da Mulher Melancia dizer que sente muito orgulho de ter uma filha vitoriosa, acredita que o discernimento nasceu para todos e o pior: é tão banana que se importa.
As Bananas são poupadas de papéis incômodos pelas outras, peças fundamentais da cadeia alimentar. A Mulher-Biscoito-Globo, por exemplo, é gostosinha, mas não mata a fome e logo eles querem outra coisa que valorizarão muito mais. O mesmo acontece com a Mulher-Aperitivo, que acompanhada de uma bebida ele come e ainda acha bom; a Mulher-Arroz, que ele só come porque já está acostumado; a Mulher-Ostra, sobre quem todo mundo fala, mas quando ele experimenta vê que não é grande coisa; a Mulher-Cafezinho-de-Loja, que ele nem faz questão, mas aceita já que é de graça, e tantas outras que equilibram o ecossistema.
Eles precisam disso porque são homens. Pelo mesmo motivo, não conseguem encontrar nada sozinhos. Você ainda não aprendeu? Ele não entende que pegou pesado? Ele é homem. Jura que vai sufocar quando só tem um nariz entupido? Ele é homem. Não sabe como não resistiu à tentação? Ah, ele é homem! Não consegue lembrar nem do aniversário da própria mãe? Normal, ele é homem! É a explicação padrão.
Eu tenho fé que algum vai ser mais original e provar que existe modelo melhor. Qual o problema de ter esperança? Eu sou mulher!

* A Mulher Banana foi categorizada pela escritora Marta Medeiros

4.5.08

Raça, amor e paixão

Era mais um feriado dos tantos que inundaram a cidade tais quais as chuvas de março, abril e maio e eu estava dormindo quando ele ligou:

- BG?

Namoro novo, onde estiver estarei. Desde que o Souza deixou meu vizinho há cerca de um ano, volta e meia o pobre grita o nome do ex-amante pela janela, intercalando com outros com quem deve se envolver por aí. Entendo o Ronaldo, olhando eu jamais diria, mas juro que o cara em várias tardes urra nomes masculinos da sacada: Léo Mouuraaaa, Bruuuno, e sempre Soooouza! As dores do coração... Domingo piora, e era mais uma dessas tardes.

Lá fui eu encontrar o novo craque da minha vida com os camaradas no Báxu. “Tô em frente ao Alemão”. Estavam todos, e com a mesma roupa. Tentei negar, mas claramente ele tinha uma chupeta pendurada no pescoço onde meus braços deveriam estar e cantava Mamãe eu quero mamar sem se importar com o tempo que faltava para o Carnaval. Decido pegar uma cerveja, as coisas vão melhorar. Um homem acende um morteiro do meu lado e a massa começa a pular com as mãos pra cima. Vieram do Maracanã, não estão exatamente perfumados.

Querido, me resgata aqui, estou sendo esmagada por tantos corpos malhados e sorrisos talhados flertando com essas bandeiras. Ele me agarra meio vidrado e berra um eu sempre te amarei. Será que me olhou e viu o Joel Santana? Temo pelo resto da noite. Mais amigos chegam e trazem uma buzina. Impedida de ir ao banheiro pela nova política do Braseiro, parto para um Koni genérico.

Vejo o Smigol no meio da multidão e percebo que atrás dele tem um corpo rubro-negro sendo jogado pra cima. Conheço aquela pessoa em êxtase no ar. Por que, meu Santo Antonio? Chora o presidente, chora o time todo e choro também. Tiro o time de campo, não tenho a menor chance. Hoje Obina é melhor do que eu.