5.4.08

Uma arma na mão e só merda na cabeça

- Fica calma, está tudo bem, mas o Pedro levou um tiro.
Esse era meu pai, sentado no sofá, aparentando ter vinte anos a mais do que tinha ontem. Ontem foi o dia em que o Pedro saiu aqui de casa com meu irmão pra irem a mais uma festinha na The Week. Bebida, mulherada, desconfio que os meninos se divertem mais sacaneando um ao outro durante a noite do que realmente pegando alguém ou dançando (homem dança na The Week?).

Era uma arruaça desse tipo que estavam fazendo ao sair da boate – “ah, muléki, e aquela baranga que te deu toco? Seu viadinho!”. A diferença é que de repente um cara empurrou meu irmão no chão, começou a chutar a cara dele e disparou dois tiros. Que sorte que ele viu Missão Impossível duzentas vezes, né? Conseguiu se esquivar e não foi atingido por nenhum disparo. Boa garoto! Mais tarde, quando eu parar de tremer e de chorar, ele vai me ensinar a técnica. Posso precisar...

O Pedro não teve tanta sorte. Quando viu o amigo no chão, correu pra cima do agressor e acabou levando um tiro na perna. “Meu filho, de cara valente o cemitério tá cheio”! Tenho certeza que a mãe do Pedro já falou isso pra ele, a minha repete como mantra tentando criar o filho no purgatório da beleza e do caos. Mas quem vai ter sangue frio ao ver alguém que gosta sendo alvo de bala?

Não dá pra trancar os garotos em casa, né? Eu confesso que a minha vontade é essa. Cada vez que vejo meu irmão sair pra noitada com a galera, torço pra ele arrumar uma namorada e viver de cinema e restaurante logo. Aí lembro que na idade dele eu saía de quinta a domingo. Isso tem uns 8 anos, e não sei se a juventude é despreocupada ou se a cidade era mesmo melhor.

Agora o Pedro saiu do hospital, meu irmão está dormindo, os outros amigos hoje não vão à The Week, repórteres de todos os cantos estão ligando pra cá e eu estou escrevendo isso só pra desabafar mesmo. Já nem é mais uma denúncia. Logo eu que fiz jornalismo pra não ficar calada! Eu que volta e meia quero mudar o mundo! Eu que sou uma cidadã indignada! Estou exausta. Minha indignação não vai mudar nada. Só quero abraçar meu irmão, ver o Pedro de novo ganhando medalha de ouro e agradecer a Deus ou quem quer que seja por ter protegido os meninos.

Não sei se os tiros foram dados pelos seguranças do Estacione Fácil, não vou questionar o fato de um prestador de serviço portar uma arma, não vou nem responder aos ignorantes que comentam no jornal que “pra tomar tiro ele deve ter feito alguma coisa”. Se eu ainda tivesse vontade de consertar o mundo perguntaria que tipo de coisa justifica levar um tiro, mas vou levantar essa discussão pra quê? Daqui a pouco grito que esses alienados merecem um tiro na testa pra parar de falar besteira e aí perco a razão.

Mas se alguém ainda tiver esperança, faz isso por mim?

4 comentários:

Pattiê, disse...

O problema é conseguir ter a tal da esperança nessa merdinha de lugar que vivemos. Acho que a questão não é "o que justifica levar um tiro", mas sim: o que faremos com os atiradores? E quanto aos que falam besteira, não ligue, eles merecem mesmo um tiro na testa.

Paula disse...

Bruna, que susto. Que merda. Que pena que vivemos nesse mundo louco.

Anônimo disse...

Esse post deveria ter mais de mil comentários. Não esses três... Vivo no Rio, me lembro de mais essa história e não pretendo esquecer. Parabens pelo blog, parabens pela coragem e nao perca a esperança. Vamos tentar não perder... Abs, Barbara

Babi disse...

Que texto ... você faz mágica com as palavras.