A Light acha que eu sou pobre. Educadamente falando, que pertenço à classe de baixa renda. Sábado à noite, planilha de orçamento nas mãos e ouço da atendente da empresa a sugestão de me cadastrar no Bolsa Família para conseguir novamente pagar quinze reais por mês de luz, e não mais trinta como vem acontecendo. Gisele, muito simpática, recomendou fortemente os benefícios do projeto do governo que visa ajudar meus semelhantes pobrinhos e explicou que a Light poderia me dar uma mãozinha se eu conseguisse me manter dentro da faixa de consumo que eles entendem como boa para mim, mas não o fazem para me punir pela oscilação no meu comportamento. Eles analisaram meu histórico, me incluíram nessa classificação econômico-social e me consideram muito instável. Às vezes enlouqueço e extrapolo, mas conta de luz não é crediário da Marisa. Achei que Gisele fosse recomendar outras ações que reforçassem meu voto de pobreza, mas ela se ateve ao quesito energia. Pelo menos, na hora, pareceu fazer isso.
A Light não desaprovou o fato de uma moça bem apessoada de 30 anos, de posse de suas faculdades mentais e possuidora de um circulo razoável de amigos passar a noite de sábado questionando os reajustes de preço aprovados pela Aneel, mas eu sei que acrescentou à minha ficha o dado de que preferi conversar com a Gisele a ver a Yvone levar mais uns tapas da Silvia na reta final de Caminho das Índias. Talvez isso represente um ponto a meu favor, afinal, TV consome muito. Talvez a moça tenha ficado com pena de mim por não ter dinheiro nem pra ir a um pagode tipo damas grátis até a meia noite e só me restado a companhia de um atendimento 24 horas. Gisele me deu o nome do Valdecir, um colega dela que trabalha no call center da CEG, e na hora não entendi, mas pensando agora vejo que foi bonito de sua parte essa outra dica. Ela poderia ter sugerido que eu passasse meus sábados na Bola de Neve Church ou recomendado livros de auto-ajuda. Se bem que ler gasta luz, reprovável.
Quando desliguei o telefone levei horas pensando sobre o parâmetro usado para consumo de luz pela baixa renda. Se uma pessoa solteira que basicamente só vai em casa para dormir gasta muita energia, como se economiza nos lares onde a renda per capita não supera um quarto de salário mínimo e há em média cinco filhos? Eles têm Net gato e painéis solares no teto? Fazem aproveitamento de energia eólica?
Que mau uso de massa cinzenta, Bruna! O importante é estarmos sempre atentos às coisas boas que nos aparecem e às mãos estendidas quando menos esperamos, identificar as oportunidades de melhoria e crescimento. A Light está me doutrinando, o desperdício é uma atitude incorreta em qualquer área. Sobre a minha incapacidade de permanecer estável até na conta de luz, prefiro não comentar aqui. Isso é entre mim e, quem sabe, o Valdecir – não posso desperdiçar um amigo da amiga assim, certo? Se casarmos a conta sobe, mas ganho alguém para pagar a metade dela.
5 comentários:
Muito bom!
ja contou pra Gisele que nao vai rolar?
Sempre muito bons seus textos, Bruna!
Como sempre.. Muito bom!
a baixa renda de verdade usa gato, moça.
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