- Oi, tudo bem? Ainda não nos conhecemos, mas eu queria conversar sobre uma proposta. Pode falar?
- Oi, quem é?
- Mamãe Noel 😊.
- Terceira mensagem de golpe hoje, mas
“Mamãe Noel” ainda não tinham inventado. De qualquer forma, não vou emprestar
dinheiro.
- Não é golpe, posso provar: recebi
sua carta de Natal. “Papai Noel, quero que não surjam novas variantes de
coronavírus e que Fora Bolsonaro se realize”.
- Vocês usam Whatssapp aí? Por que
me fazem mandar cartinhas há anos?
- Os Correios eram nosso patrocinador,
acordo de exclusividade, mas fechamos com o Meta agora.
- Ainda bem que não foi TikTok, eu
não faria dancinha com as mãos para ganhar presentes.
- Esse ano os pedidos já podem ser
feitos por direct no Instagram.
- Tipo flerte.
- Isso, está em fase beta ainda
porque estou avaliando o risco de nudes.
- Quem mandaria nudes para Papai
Noel?
- Você não tem ideia!
- Achei que só sexualizassem você. Qual
é a proposta, aconteceu alguma coisa com o Papai Noel?
- Me ouviu.
- Está tudo bem com vocês?
- A vida, altos e baixos, mas
estamos em uma fase boa do casamento, sendo companheiros, até transando.
- Não estou preparada para sexo e Papai
Noel na mesma frase.
- Preconceito com a vida sexual dos
idosos?
- Desculpa. Vou ganhar meus
presentes?
- Você sabe que não somos o gênio
da lâmpada, né? Não realizamos desejos,
entregamos presentes. Pode pedir algo produzível?
- Carnaval pode ser?
- Algo que possamos fabricar aqui.
- Então os duendes fazem tudo aí
mesmo?
- Que duendes fazem tudo? Você já
viu homem fazer tudo?
- Eu nunca soube muito bem o que
você fazia na história.
- Nunca soubemos o que tantas mulheres
fizeram na História.
- Sim. Achei que você fosse uma
vovó fofinha da propaganda.
- Às vezes sou, às vezes não. Por
isso te procurei: tenho lido uns livros, conversado com pessoas e decidi assumir
meu protagonismo, quero sair da sombra do Noel. Estou montando uma nova equipe,
mais diversa, e quero convidar você para participar.
- Uau! Mas o que eu faria? Não me
vejo como elfo, não sei se tenho perfil para rena... E trabalhar na Lapônia...
- Eu mesma já não estou mais
presencial todo o tempo, implementei trabalho remoto. Quero rever contratos com
marca de refrigerante, montadora de trenó, nosso figurino, modelo de gestão, renegociar
direitos de imagem para exigir igualdade de exposição e cachê, penso até em
cancelar umas músicas. Só criticavam a distribuição desigual de presentes, isso
é a ponta do iceberg! Para a estrutura ninguém queria olhar.
- Uhn, revolucionária! Vai ter
gente te chamando de Mamãe Noel comunista e cimentando chaminé com medo de você
entrar, hein.
- Estou preparada para os haters, há
anos só existo em sex shop e Halloween ou fazendo biscoitos como figurante. Estou
nos bastidores há anos, cada vez que a Simone canta “então é Natal e o que você
fez” tenho vontade de gritar a lista de coisas. Até helicóptero para Papai Noel
descer no Maracanã já pilotei! Se não sou eu a organizar tudo por aqui, Noel e
os duendes ficavam vendo futebol sem saber quem pediu o quê.
- Estou chocada. E dou todo o apoio.
Mas, se não é para ser duende nem rena, para o que você precisa de mim?
- Para contar a minha história.
- Só isso?
- Isso é o que nós mulheres mais
precisamos que aconteça.
- Combinado, começo hoje mesmo!
- Sabia que poderia contar com você,
obrigada. Feliz Natal, muito amor e paz pra você.
- E pra-vo-cê!
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