9.10.06

When I'm 28

Você não tem emprego, você fica mais velha, o espaço destinado às coisas que levará para a sua futura casa aumenta no armário, você arranha seu carro que completou 15 mil quilômetros e precisa de uma revisão além de renovar o seguro, acabou a cota de sol no Rio, boletins de CTI voltam a fazer parte da sua rotina, suas séries favoritas estão de férias, durante o Festival do Rio você está em São Paulo, suas milhas só te levam para Frankfurt ou Buenos Aires, você não pode voltar para Buenos Aires, você não tem dinheiro para viver em Frankfurt, quando percebe você só escreve sobre política e fica feliz que serão três debates no próximo mês, suas bolinhas homeopáticas estão acabando e você pensa em economiza-las para não ter que pagar outra consulta, sua mãe é agredida por um consertador de máquina enfurecido, você compra um vestido para a festa e descobre que está fantasiada de Ferrero Rocher mas ao contrário do bombom não tem ninguém para aproveitar tamanha delícia, você não consegue se apaixonar por quem deveria, o nerd da escola te encontra e diz que além do mega emprego está feliz porque vai casar, você começa a trocar o dia pela noite e pensa que pelo menos vai transformar aquilo tudo em textos de humor negro, até descobrir que por um mistério lostiano que pode ser chamado de burrice da Uol, seu blog é bloqueado e você nem pode mais usá-lo para deixar um recado avisando que se mudou. É quando suas amigas intervêm e sugerem fazer um filme usando tudo isso já que não deveria ser época de inferno astral delas mas estão todas mais ou menos no mesmo barco quando deveriam estar voltando do trabalho em suas Pajeros, indo buscar os filhinhos fofos na pracinha onde foram brincar com a babá, para encontrar papai de terno bebendo um vinho caro na casa decorada com girassóis. Filhinhos dão muito trabalho, babás esmurram criancinhas, pracinhas ao ar livre são alvo de bala perdida, Pajeros não cabem nas vagas da cidade, papai de terno vai te trair, se quiser troca o vinho por Absolut e os girassóis por flores artificiais que não morrem. Ou vai buscar o filho único de mãe solteira na casa da vovó de carro popular financiado em cinqüenta meses, esquenta a comida no microondas e toma um Rivotril para dormir bem porque amanhã a tia da escola quer falar com você antes do trabalho e se atrasar o fdp do seu chefe vai encher o saco. Ou se arruma no banheiro da academia, primeira ação do dia que começou às duas da tarde, corre pro analista, liga pra sua mãe no caminho dizendo que não vai jantar, passa no Bobs e faz uma hora na casa de uns amigos antes de ir pra boite de onde só vai sair quando o sol nascer, e se alguém disser que isso não é vida pergunta por que não avisaram antes que aquela casa da Barbie rosa jamais poderia se transformar em realidade já que com aqueles peitos e aquela cintura você seria ainda mais esquisita. Pergunta se a faculdade e os trezentos cursos extracurriculares que entopem seu currículo devolvem o dinheiro em caso de defeito no processo. Pergunta se os instáveis que juraram amor eterno não te acham mais a mulher mais sensacional e divertida que eles conhecem. Pergunta por que quando você fazia brincadeirinhas para descobrir com quantos anos se casaria e quantos filhos teria, ninguém rasgou aquele papel e te mandou escolher o fundo de aplicação mais rentável e não o nome do príncipe idealizado. Por que venderam uma imagem de vida feliz que não se parece em nada com a sua vida, por mais feliz que ela seja. Por que disseram que quase 30 já é adulto e adultos são independentes. Por que só nos filmes independentes os personagens são uma confusão ambulante e você passou a vida assistindo à blockbusters hollywoodianos onde o amor vence, está sempre sol e se chove as pessoas dançam com os postes. Por que você seguiu o caminho certo e deu de cara num muro sem que ninguém entregue a estrelinha invencível do Mario Bros. Por que os galãs da escola ficaram ultrapassados e não foram substituídos por modelos atualizados. Por que depois de uma noite de debate vocês concluem que não é uma boa estratégia ser cheia de opiniões e o marketing da parvinha ingênua e indefesa ganha mais eleições. Por que as coisas pareciam mais fáceis na época dos seus pais, que deveriam pensar o mesmo sobre a dos seus avós e assim por diante. Por que você insiste em querer se empolgar com qualquer coisa que te tire dessa luta inerte pela sobrevivência. Por que você apaga as velinhas do bolo e pede disposição, definição e coragem. Porque quando você tiver 64 vai querer rir desses dilemas, e precisa acreditar que vai ter valido a pena.

10 comentários:

Anônimo disse...

A gente já ri aos 26, não sou como você, ainda tenho 26. E não se preocupe, pq antes da crise se instalar vão ter sempre amigas sofrendo mais para ocupar o nosso tempo, Bruhuhuhuhuna! (caldeirão)

Anônimo disse...

Sempre uma boa leitura.
Gostei da economia das bolinhas para não pagar mais uma consulta!
Hehe!
Tenho feito isso!
Vou cobrar os direitos autorais! Hehe
Beijos!
André Cyrino

Anônimo disse...

Aos 53 anos , eu te digo mesmo sendo agredida , tudo vale a pena,e eu consigo rir. Beijos Mae

Anônimo disse...

B.D., já anunciei o lote novo lá na Casa. Agora é bola pra frente!

Anônimo disse...

Como já fiz todos meus comentários na noite de sexta sobre esses assuntos, passei apenas para ar um OI nesse novo espaço.

Anônimo disse...

E as pessoas ainda perguntam se estamos fazendo curso para assustá-las, hahahha. O importante, é que a gente ri. Mesmo com a mãe agredida... A gente sempre ri no final!

Anônimo disse...

Bruna, pessoas sensíveis e inteligentes como você costumam se sentir inadequadas, mas isso passa. Calma, menina, tudo o que vale a pena costuma ser difícil. Tenho mais de 40 anos, e ainda hoje ou principalmente, peço sempre coragem quando assopro as muitas velhinhas. Torço de longe por você!!!

Anônimo disse...

Bruna, no meu comentário abaixo, escrevi "velhinhas" em vez de "velinhas". Talvez seja um ato falho. Eu, realmente, devo estar querendo "apagar" algumas velhinhas da família (rsrsrs).

Anônimo disse...

"acima" - tá difícil

Anônimo disse...

Bruna,
Mais uma vez gostei do seu texto e feliz ou infelizmente me identifico. Parabéns pelo ttalento!
Inté!
Renata