Tínhamos acabado nos conhecer, Catarina e eu, e almoçávamos em Napa, quatro taças mais leve – três e meia, que do Zinfandel não gostei. Ainda ríamos do simpático responsável pela vinícola que defendia a idéia de que uma garrafa de vinho aberta deveria ser consumida naquela mesma noite, no máximo duas depois, e quem não é capaz de fazer isso que beba Bud Light. Foi logo após essa lição que Catarina veio ver minhas anotações: “você está estudando vinhos?” De certa forma sim, mas na verdade só entendo o que escrevo então à medida que nosso guia ia falando eu ia anotando – e bebendo.
Então eu era brasileira, férias na Califórnia, e ela, o que fazia? “Nada. Vou morar na Toscana.”
Saímos andando até a área permitida para cigarros, onde estava Patrycia. Em Wine County se pode beber dentro dos lugares e fumar fora deles, jamais os dois juntos. Patrycia também não fumava, mas ali estava para conversar. Havia tirado três meses dos seus oitenta anos para dar uma voltinha, gostou muito de Salvador e Havana, aquela era a última parada antes de retornar a Sidney, Austrália. Com um inglês enrolado nos contou que viajar era o passatempo preferido dela e do marido, falecido oito meses antes. Passado o luto ela manteve o hábito, é o que gosta de fazer. Agora ia sozinha com seu casaco de nylon branco e cabelos no mesmo tom.
Catarina se mudaria para a Toscana com o namorado. A filha estava criada tentando superar a crise econômica na Flórida, nasceu quando ela tinha vinte e poucos anos e trocou a idéia de trabalhar na ONU por uma paixão mexicana. A nova paixão era do ramo de turismo e quicava pelo globo, quanto tempo mais ela se prenderia a estafantes reuniões de apresentação de resultados e análise de riscos em multinacionais? “Descobri que mais da metade do meu dia eu passava resolvendo problemas que para mim não representavam ameaça alguma. E que a Toscana é extremamente agradável”.
A nova cidadã italiana terminou seu cigarro, passamos em mais alguns oásis de Baco e voltamos a San Francisco. Ao descer do ônibus, Patrycia se despediu: “girls, stay safe.”
À noite achei, jogada dentro da mochila, a bateria da câmera que pensei ter deixado no hotel. Não tenho uma só foto dos intermináveis vinhedos e suas rosas! Alguns momentos são irretratáveis e inesquecíveis. Preste atenção.
You too, Patrycia.
31.12.09
23.12.09
21.12.09
17.12.09
Laughing all the way
Você descobre que é hora de acabar o ano quando passageiros de um avião se rebelam e começam a berrar com os comissários porque a neblina impediu o pouso em São Paulo. Vindos de Londres, os viajantes não queriam descer no Rio de Janeiro: “vamos nos assustar com aqueles presépios! Toca pra Viracopos!”. Semanas antes, no dia da final do Brasileirão, Herbert Vianna assumiu o microfone da aeronave na qual voava e puxou à capela o hino do Flamengo, transformando a ponte aérea em uma jam session. Dezembro estressa.
No mais perfeito clima Al Gore falou, Al Gore avisou, a estufa carioca não tem mais sol, uma lama provocada pelas chuvas semanais cobre os caminhos por onde Madonna pisou e o choque de ordem previsto para as praias faz aumentar o preço das cadeiras que não estão sendo usadas. As garotas de Ipanema não tem marca de biquíni (ou essa garota cresceu e trocou as areias nubladas por um escritório com ar condicionado quebrado?).
A década vai acabando e só me dou conta de que o bug do milênio é passado distante quando a playlist que mais anima as festas tem o nome de “músicas anos 90”, nostalgia indicadora de que aqueles adultos viveram bem suas adolescências. Correm na web listas de retrospectiva, “os dez mais de qualquer tema”, e nem sei se o Cold Play é coisa de agora ou tempos remotos, aqueles onde líamos jornais em papel. É melhor parar o texto por aqui, resistir à pressão de refletir e avaliar e planejar – depois do dia 31 vem o dia 1 como em qualquer outro mês.
Ao contrario do que diz um estudo de saúde pública da Austrália, Papai Noel não precisa perder peso nem trocar o trenó por bicicletas para servir de exemplo para as crianças. Deixem o velhuxo beber sua Coca-Cola, delegar as funções aos duendes e continuar com o olhar condescendente que só alcança quem já chutou o balde. Ele tem um sorriso feliz.
Tente se manter são nesse Natal.
No mais perfeito clima Al Gore falou, Al Gore avisou, a estufa carioca não tem mais sol, uma lama provocada pelas chuvas semanais cobre os caminhos por onde Madonna pisou e o choque de ordem previsto para as praias faz aumentar o preço das cadeiras que não estão sendo usadas. As garotas de Ipanema não tem marca de biquíni (ou essa garota cresceu e trocou as areias nubladas por um escritório com ar condicionado quebrado?).
A década vai acabando e só me dou conta de que o bug do milênio é passado distante quando a playlist que mais anima as festas tem o nome de “músicas anos 90”, nostalgia indicadora de que aqueles adultos viveram bem suas adolescências. Correm na web listas de retrospectiva, “os dez mais de qualquer tema”, e nem sei se o Cold Play é coisa de agora ou tempos remotos, aqueles onde líamos jornais em papel. É melhor parar o texto por aqui, resistir à pressão de refletir e avaliar e planejar – depois do dia 31 vem o dia 1 como em qualquer outro mês.
Ao contrario do que diz um estudo de saúde pública da Austrália, Papai Noel não precisa perder peso nem trocar o trenó por bicicletas para servir de exemplo para as crianças. Deixem o velhuxo beber sua Coca-Cola, delegar as funções aos duendes e continuar com o olhar condescendente que só alcança quem já chutou o balde. Ele tem um sorriso feliz.
Tente se manter são nesse Natal.
15.12.09
Capítulo 4
Todos os dias, às vezes pela manhã, ou entre uma coisa e outra, algumas logo antes de adormecer, lembrava-se dele. Contasse para diferentes pessoas sobre espontânea rotina perceberia reações diversas - os poetas sorririam, psiquiatras receitariam, ele a abraçaria com carinho.
Ali do alto, procurando por de cima da nuvem, desconfiou que talvez ele não existisse - fosse construção de lembranças dele com delírios dela, contos de fada, finais felizes e sobrancelhas arqueadas num suspiro. Queria tanto. Mas entre o tanto e o mesmo havia uma névoa, emaranhado de fios intransponíveis.
Como tinha tempo, puxou uma pontinha. Continuou puxando. E enquanto cantava percebeu que estava desembaraçando, precisava colocar aquela fiarada em algum lugar, e enquanto desembaraçava percebeu que estava cantando. Ficou estupefata. Se conseguisse guardar um punhado daquela sensação em um potinho seria o suficiente para ter fôlego e descer. Se soubesse o que fazer com a fiarada poderia tentar.
Começava a acreditar que na história da cigarra e da formiga uma tinha casa para o inverno, mas a outra tinha histórias de verão.
Ali do alto, procurando por de cima da nuvem, desconfiou que talvez ele não existisse - fosse construção de lembranças dele com delírios dela, contos de fada, finais felizes e sobrancelhas arqueadas num suspiro. Queria tanto. Mas entre o tanto e o mesmo havia uma névoa, emaranhado de fios intransponíveis.
Como tinha tempo, puxou uma pontinha. Continuou puxando. E enquanto cantava percebeu que estava desembaraçando, precisava colocar aquela fiarada em algum lugar, e enquanto desembaraçava percebeu que estava cantando. Ficou estupefata. Se conseguisse guardar um punhado daquela sensação em um potinho seria o suficiente para ter fôlego e descer. Se soubesse o que fazer com a fiarada poderia tentar.
Começava a acreditar que na história da cigarra e da formiga uma tinha casa para o inverno, mas a outra tinha histórias de verão.
6.12.09
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